11 dicas pra GenZ que quer morar sozinha e buscar independência
Vem comigo desenvolver esse córtex pré-frontal
Eu não conheço a sua realidade nem seus hábitos. Não sei quem te criou nem como te criou. Mas aconteça o que acontecer, um dia, muito provavelmente, você vai morar sozinha - e se eu puder te dar um conselho, faça isso antes de se casar e dividir novamente seu espaço com alguém. É sozinha que a sua realidade é construída e o seu ser constituído.
“Quando estou sozinha, pertenço a mim mesma”- Anaïs Nin, Diários
Eu sei, é difícil sair da casa dos pais. Não só pela comodidade, mas a nossa geração (1995-2010)1 não tem outra alternativa a não ser esperar. Esperar a estabilidade financeira, esperar os preços baixarem, esperar ser promovida, almejar por um cargo mais alto, por condições financeiras melhores. E, não menos importante, aguardar ansiosamente pela sanidade mental e estabilidade emocional.
Mas, pra quem já tá pronta, aí vai:
1. A relação com os seus pais (ou pais de criação - vó, tia, madrinha) vai mudar pra melhor!
Me mudei aos 24 anos e hoje, com 26, afirmo que o medo de me distanciar da minha família era apenas mais uma fantasia neurótica.
Quando passo o fim de semana com meus pais, assistindo filmes, jogando dominó ou simplesmente existindo com eles, percebo que pela primeira vez estamos vivenciando a nossa relação com qualidade. Esse pequeno espaço de tempo é investido com toda a minha presença - e quando morava com eles, costumava ficar trancada no quarto vivenciando a minha própria realidade, irritada com barulhos, interrupções ou com a própria rotina deles. Hoje, construí a minha.
No início, eles vão resistir. Você vai ouvir que é incapaz de limpar o próprio quarto, que não vai aguentar dois meses ou que a casa vai pegar fogo na primeira semana - mas sinceramente? Eles só estão esperando pra serem surpreendidos com a sua capacidade de lidar com algo que nunca lidou antes. E, pela primeira vez, você vai ser vista como um indivíduo com particularidades.
Ooh, and I'm too messy, and then I'm too fucking clean. You told me: Get a job, then you ask where the hell I've been. - Lola Young, Messy
2. A sessão CASA do mercado vai passar a ter outro significado e aos poucos o seu ambiente vai ter a sua personalidade
Juro, qualquer lugar é lugar pra comprar um adorno - pratos, canecas, sanduicheira azul, velas aromáticas, abajur em formato estranho ou uma sei lá, um pôster da Hannah Montana. Se permita ser você mesma e descobrir qual paleta de cores, formatos e estilos combinam com a sua personalidade. É também um exercício de autodescoberta (e o Pinterest é o seu maior aliado).
Não tenha medo de ousar: misturar cores, estilos e até estranhezas - eu divido a sala, o ano inteiro, com um mini papai noel dirigindo um carro rosa. Também tem um quadro sem muita resolução da Audrey Hepburn (comprado na loja de dez reais) em cima do meu rack combinado com um cinzeiro (não fumo) comprado numa feira de artesanato em Ouro Preto, MG.
3. Você nunca teve que contratar internet ou trocar a tampa do ralo, né? Bom, agora têm.
E eu particularmente patinei um pouco (muito) na hora de tentar desentupir a pia e escolher os alimentos que fariam parte do meu dia a dia - arroz integral? Massa sem glúten? Café do Serrado? Frango orgânico??? E assim descobri que pizza congelada não é uma opção.
Mas a pior situação de todas, foi: no início, quando ia lavar roupa, a minha ignorância doméstica me fez manchar todas as peças brancas com sabão em pó azul. Além da capacidade burra de encolher grande parte na máquina de secar - peça ajuda!!!
4. Segurança, segurança e segurança
Não seja tão simpática e aberta com pessoas que não conhece - dentro e fora do condomínio. Mantenha a porta de entrada sempre trancada e se possível, use uma fechadura tetra também.
Sobre os prestadores de serviço, se só tiver como recebê-los sozinha, não feche a porta principal enquanto eles estiverem trabalhando. E avise alguém de confiança sobre a visita técnica.
Não dá pra confiar em todo mundo.
5. Fazer a sua comida é mais barato e mais saudável.
Semanalmente, escolha um prato específico - frango grelhado com arroz e batatas ou carne com legumes refogados - e decida um dia na semana pra preparar. Separe tudo em marmitas e congele pra comer nos próximos dias.
Se você gosta de cozinhar, maravilha, segue em frente. E se não gosta, segue em frente, também, porque nem é tão difícil. Otimiza o seu tempo, te possibilita gastar (bem) menos e ainda pode virar um hobby (tô sendo otimista demais).
E não caia na armadilha de comprar besteiras pra comer em momentos estratégicos - elas vão durar no máximo 3h na sua geladeira ou no seu armário.
6. O seu dinheiro vai voar enquanto a sua imaginação flutua na vitrola vintage que viu na Amazon
- que se encaixaria com primor no rack da sala.
Sim, chegou a hora de vestir a camisa de provedora e de dizer adeus ao consumismo desenfreado.2 As prioridades são outras e a vitrola vai ter que ficar pro mês que vem (ou ano que vem) quando as 60 parcelas de 12x estiverem pagas. Você vai perceber que vai ser difícil ter uma reserva financeira porque uma geladeira custa o valor de uma viagem pra Porto Seguro - então, pense bem antes de tomar qualquer decisão.
7. Tenho duas notícias, uma boa e uma ruim: a ruim é que você vai ficar sozinha e a boa é que você vai ficar sozinha
Eu, particularmente, não gosto de dividir o ambiente com outras pessoas quando não tô bem (vez ou outra entro numa cilada melancólica), mas entendo a necessidade de não me isolar por muito tempo e assim que possível, buscar a companhias.
E a maior vantagem disso tudo, é: você escolhe quando ficar sozinha e quando receber as suas amigas pra um brunch, jantinha ou uma festa do pijama com colchões espalhados pela casa, colagens, luzes quentes e Sabrina Carpenter. - juro, é maravilhoso!!!
Saber que tem pessoas ao seu redor dispostas a te amar e respeitar, é reparador. Mas entender a importância de se amar e se respeitar, é essencial pra construção da sua individualidade - dentro e fora do seu mundinho particular.
8. Bem-vinda às suas novas manias!
Eu desenvolvi o hábito de viajar e SEMPRE comprar um ímã de geladeira. Não consigo comer se não estiver assistindo um episódio de uma série ou ouvindo um podcast. Tomo iogurte natural com frutas no café da manhã, almoço 13h e janto crepioca recheada. Sem falar na mania de limpeza que desenvolvi. Louça na pia? Só em casos de cansaço extremo.
Eu tinha medo de não saber lidar com a minha própria bagunça e acabar morando dentro do caos. - Mas no fim das contas, você acaba carregando as manias dos seus pais e justificando cada punição deles (sorry).
9. Será que sou capaz de cuidar de uma vida?
Há 1 ano e meio estava voltando de uma viagem de carro da Argentina com o meu namorado, quando na estrada em Chapecó nos deparamos com uma cadelinha desesperada - claramente abandonada. Tínhamos acabado de almoçar (chuleta) e tinham algumas sobras no banco de trás. Não pensamos duas vezes e ele levou a carne pra ela.
Aquela cena me despedaçou. Deixaríamos a carne e íamos embora? Eu não consegui. Desci do carro e carreguei aquela cadela dócil (extremamente dócil) e disse “ela vai com a gente.” Será que largamos numa cidadezinha de cinco mil habitantes pra vizinhança cuidar? Esse era o plano. Mas não conseguimos. “Ok, vou levar pra casa, cuidar e colocar pra adoção em Florianópolis” - onde moramos.
Foi uma semana completa cuidando da Chuleta - sim, seu novo nome - e eu tava cogitava ficar com ela.
Mas não consegui. Olhava pra aquele ser indefeso que dependeria totalmente dos meus cuidados e chorava. Lamentava a minha incapacidade de ser uma cuidadora genuína. - E no fundo, vocês sabem, isso não era só sobre a cadela.
Hoje, Chuleta, atual Julieta, tá na casa da minha tia com seus novos irmãos - Lupi e Bela - feliz, bem tratada, vacinada e gordinha. E apesar de não ter adotado ela, me sinto extremamente grata pelo final feliz.
Mas o ponto, é: tenho uma gata na casa de meus pais, a Clara Charlotte, que adotei no colégio, em 2012. Mas ela nunca dependeu totalmente de mim. E passou a ser assustador imaginar uma vida depender dos meus cuidados - por que, afinal, será que sou capaz de cuidar de mim?
Foi uma situação tão frustrante que só hoje consegui comprar uma planta - uma roseira cor de rosa que precisa de mim pra continuar viva.
Achei essa introdução importante pra ressaltar, que: adote um bichinho. Mas adote se a sua saúde física, mental e emocional estiverem em dia. Senão, comece tentando cuidar de você.
Se eu não tivesse encontrado a minha tia pra ficar com a Chuleta, eu ficaria. Eu teria enfrentado minhas inseguranças e curado alguns medos à força. Acho que eu teria me surpreendido comigo mesma - como já me surpreendi em várias primeiras e assustadoras vezes.
10. Tenha sempre veneno de barata!
Eu sei, não combina com a sua estética. Mas, a não ser que você ligue pro seu pai, seu namorado ou bata na porta do vizinho uma hora da manhã (não faça isso), se prepare pra visitas noturnas inesperadas.
Convenhamos, se você já decidiu morar sozinha, aproveite a oportunidade pra vestir a camisa de mulher e finja ser quem você vai ser um dia - autoconfiante.
Eu não me preparei. E quando me deparei com a diva pela primeira vez, do lado do sofá da sala, paralisei e corri pro quarto (calma, eu ainda tô vestindo a camisa de mulher).
Não consigo pisar. Por isso, agora tenho um kit matador de baratas espalhados debaixo dos móveis e um SBP pronto pra agir. Os ralos também estão devidamente tapados e de noite, todas as janelas são fechadas.
O que aprendi, é: são seres indefesos, muito menores que eu, que não oferecem ameaça nenhuma. NÃO, não é hora de humanizar a barata (sorry, Gregor Samsa)3. Apenas lide com o fato de que elas voam mais alto do que podemos imaginar e sobrevivem a bombas nucleares.
Vai lá e mostra pra eles quem é a geração mimimi.
11. Não tenha vergonha de se sentir uma adulta disfuncional - você está buscando mudar isso.
E morar sozinha é um instrumento, e não a solução de todos os seus problemas estruturais.
Eu, como uma GenZ de 1999 (criada e educada por boomers), afirmo que sou uma grande admiradora dos nossos valores. Ninguém, de fato, quer ser desrespeitado, humilhado ou menosprezado no mercado de trabalho e, por isso, o nosso limite é curto. Assédio moral, sexual, sobrecarga, realmente só acontecem uma vez - e é inegável: priorizar a nossa saúde mental e esperar que empregadores respeitem e apoiem a nossa sanidade, têm servido de impulso para as empresas se reinventarem e mudarem seus modelos de trabalho.4
Mas, infelizmente, quando tomamos a régia e vamos viver sozinhos, o filtro de abusos aumenta. Acabamos aguentando a carga e aceitando situações contestáveis - aliás, como vou pagar o próximo aluguel?
Aos 17, morando com os meus pais, no meu primeiro emprego, me senti invalidada quando aceitei por três meses assédio moral e sexual numa empresa pequena. Me demiti e tudo ficou bem.
Mas aos 21, recém-formada, na pandemia, decidi morar sozinha (com um casal de amigos) e tudo o que eu aguentei durante um ano no meu emprego da época custou minha paz de espírito, minha integridade moral e minha saúde mental - mas eu precisava pagar as contas.
Voltei pra casa dos meus pais porque percebi que não tava pronta pra sair. (Era o emprego errado, eu não sabia me posicionar em situações de abuso e minha autoestima era lastimável).
Hoje, apesar de ainda não ter conquistado todo o meu território mental, eu finjo. Finjo ser quem eu quero ser, finjo ter propriedade em matar baratas e vou fingir até o dia que me tornar.
A
descreveu mais detalhadamente o processo no último texto, "Fake it until you make it":"Assumir a postura, a energia e o mindset da pessoa que quer se tornar, mesmo antes de se sentir totalmente pronta é um dos melhores jeitos de estar um passo a frente de si mesma.
Sempre que você pensar: “Uow, eu não estou pronta. Eu não consigo fazer isso.”Pare por alguns segundos, respire fundo e finja que está pronta."
Por que preciso de autoconfiança?
Vivemos em sociedade. Hoje, a maioria dos empregadores são da Geração X e Baby Boomers - e isso não pode ser um empecilho pra continuar. Da mesma forma que estamos chegando pra agregar e apresentar uma nova visão de mundo, as gerações passadas, mesmo que conservadoras, tem muito o que nos ensinar sobre carreira, responsabilidade e organização. Vez ou outra, vamos nos deparar com situações constrangedoras e ouvir a frase mais misógina do mundo dentro de um escritório. Mas aprender a se posicionar sem ferir e ser forte pra suportar (se apoiando nos princípios e valores que decidimos levar pra vida), são passos importantes pra desenvolver a própria independência e funcionalidade.
Por isso, em qualquer lugar que pisarmos, alguém vai agir contra a nossa crença. E eu, particularmente, já saí bufando, perdi a paciência e chorei de raiva tentando explicar o que pra mim parecia óbvio - que pro outro não era. Mas com o tempo descobrimos que há formas de lidar com isso: estudar, acreditar nas próprias ideias, ouvir o outro lado e se for enfrentar, que seja com elegância, boa argumentação e por mais difícil que pareça, empatia. Não sou eu que vou mudar a opinião de alguém que nasceu décadas antes de mim. Aliás, esse não é meu trabalho. Meu trabalho é continuar vestindo a camisa de mulher, mergulhando em conhecimento, filtrando aprendizados, acreditando nos meus ideais e os compartilhando com quem tá disposto ouvir.
Sobre o tema, retirei o parágrafo seguinte do texto A raiva feminina: um sentimento legítimo e revolucionário, da
“A filósofa e escritora Audre Lorde dizia que a raiva não precisa ser destrutiva, mas sim transformadora. E não poderia estar mais certa. Quando usamos nossa raiva de maneira consciente, ela nos dá o impulso necessário para questionar as estruturas opressoras que tentam nos calar. A revolução feminista, afinal, nasceu da raiva. Raiva contra a desigualdade, contra o machismo, contra a violência que tentam normalizar como parte da nossa rotina. Quando somos chamadas de "histéricas", é a sociedade que está com medo do poder que temos de mudar tudo isso"
Conclusão: você não precisa ser a mudança quer ver no mundo. Se contente, apenas, em amadurecer por si só, seja morando sozinha, cuidando de uma planta, fazendo terapia ou criando uma rotina saudável pra sua vida. Cuide das suas emoções, seja estudiosa e preserve a sua essência.
Gregor Samsa é o personagem principal do livro A Metamorfose, de Franz Kafka. O caixeiro- viajante se transforma, do dia pra noite, em um inseto monstruoso (uma barata) e a sua primeira preocupação quando percebe a mudança é de como irá trabalhar.
Texto necessário!
eu nem tô perto de morar sozinha mas li até o final e queria dizer que quase chorei com a parte da chuleta😭 vocês foram incríveis!!
(e tb amei as dicas